1-CONCEITO E UMA PRIMEIRA VISÃO CRÍTICA
A chamada “Violência Psicológica” contra a mulher tem sua primeira regulação legal com o advento da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06), em seu artigo 7º., II.
Ocorre que a Lei 11.340/06, embora tratando da violência doméstica e familiar contra a mulher, praticamente não prevê crime algum especial, salvo, excepcionalmente, mesmo assim após uma pequena reforma, o crime de descumprimento de medida protetiva de urgência, conforme artigo 24 – A do mesmo diploma, inserido pela Lei 13.641/18. No mais, o que a Lei 11.340/06 faz com relação à violência de gênero contra a mulher no âmbito doméstico e familiar é prever um tratamento penal, processual penal e de execução penal mais rigoroso e adequado ao agressor. Não obstante, os crimes a serem imputados são aqueles já normalmente previstos no ordenamento jurídico (v.g. Feminicídio, lesões corporais, ameaça, constrangimento ilegal, sequestro e cárcere privado etc.).
Os crimes já previstos legalmente no ordenamento, acaso cometidos em situação de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos estritos termos do artigo 5º., I a III da Lei Maria da Penha, têm um tratamento diferenciado de acordo com suas normas (da Lei Maria da Penha), conforme acima exposto.
O artigo 7º., do diploma enfocado apresenta as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, sendo elas a violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Em cada um dos cinco incisos desse dispositivo há uma definição de uma espécie de violência, mas isso não significa que o citado artigo 7º., preveja condutas criminais ou, melhor dizendo, tipos penais incriminadores. Ali há apenas definições abstratas de espécies de violência, as quais podem ser cometidas por meio de condutas criminosas previstas no ordenamento jurídico – penal brasileiro. Então, por exemplo, o indivíduo que agride fisicamente a sua esposa, causando lesões leves não responde por um suposto crime previsto no artigo 7º., I, da Lei 11.340/06, mas pelo crime de lesões corporais qualificado, conforme consta do artigo 129, § 13, CP. Acontece que tal crime será abrangido pela Lei Maria da Penha e seu tratamento mais rigoroso ao agressor sob vários aspectos, tendo em vista tratar-se de situação de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do artigo 5º., I e II na sua espécie de “violência física” (artigo 7º., I). O mesmo raciocínio vale para um estupro praticado pelo namorado contra a namorada. Nesse caso, aplicar-se-ia o artigo 5º., III e a espécie de “violência sexual”, conforme artigo 7º., III, sendo o crime imputável o previsto no artigo 213, CP.
Quanto à chamada “Violência Psicológica” sempre se procedeu dessa mesma forma. Havendo a situação de violência doméstica e familiar contra a mulher (artigo 5º., I a III) e configurada uma hipótese de “Violência Psicológica” (artigo 7º., II), o infrator seria submetido à imputação de algum crime previsto na legislação penal, como, por exemplo, ameaça, perseguição ou Stalking, sequestro e cárcere privado, constrangimento ilegal etc. Mais uma vez, seguindo a normalidade da Lei 11.340/06, a chamada “Violência Psicológica” descrita no artigo 7º., II do mesmo diploma não era um tipo penal específico, mas apenas uma descrição abstrata, uma definição de espécie de violência, que poderia abranger vários tipos penais, conforme as circunstâncias do caso concreto.
Com o advento da Lei 14.188/21, no que tange à “Violência Psicológica”, altera-se a sistemática usual da Lei 11.340/06, criando-se um subsistema incriminador dentro do subsistema de tratamento específico da violência doméstica e familiar contra a mulher. Agora temos uma coisa parecida com aquelas bonecas russas Matryoshkas: há o sistema penal comum, dentro dele o subsistema diferenciado para o tratamento da violência doméstica e familiar contra a mulher com seu funcionamento já descrito, e, finalmente, dentro do último subsistema, há um outro subsistema para a “Violência Psicológica”, com uma regulação diferenciada dos demais casos.
Ao invés de permanecer a definição de “Violência Psicológica” adstrita ao artigo 7º., II e buscando-se, no caso concreto, um crime específico no ordenamento (como ocorre em todos as demais espécies de violência previstas no artigo 7º.), optou o legislador por criar uma incriminação direta e específica da própria “Violência Psicológica”, praticamente copiando a redação do dispositivo em destaque da Lei Maria da Penha. Em outras palavras, erigiu o legislador em crime a própria definição abstrata de “Violência Psicológica contra a Mulher”.
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