Um dos nortes que guiam o processo administrativo fiscal deve ser a busca constante pela verdade material [1], definida como:
“A verdade material deverá subsidiar o processo administrativo, devendo a autoridade julgadora buscar a realidade dos fatos, conforme ocorrida, e para tal, ao formar sua embasada convicção na apreciação dos fatos, podendo realizar as diligências que considere necessárias à complementação da prova ou ao esclarecimento de dúvida relativa aos fatos trazidos no processo.”
Qual a finalidade desta busca?
A autoridade fiscal julgadora deve conferir se os atos que são praticados pelos contribuintes relativos às obrigações tributárias principais e secundárias são lícitos e se as normas tributárias praticadas pelos erários estão de acordo com a respectiva legislação. Em outras palavras é um “cara-crachá” verificador se o contribuinte e a fazenda andam na linha.
Ao emitir um juízo de valor, a autoridade administrativa fiscal deverá ter previamente analisado a idoneidade dos procedimentos fiscais adotados e as provas apresentadas.
A princípio, o processo administrativo tributário não se deve apegar em formalismos excessivos para a conclusão de seus julgamentos, caso contrário haverá uma migração não desejada destes litígios ao judiciário, entupindo ainda mais a já emperrada e morosa máquina da justiça.
O que dizem as leis?
A Lei nº 9.784/1999, ao estabelecer diretrizes para o processo administrativo federal, garante às partes a apresentação de documentos antes da prolação da decisão pelo órgão competente para contribuir na formação do seu convencimento, possibilitando, inclusive, a determinação de quantas diligências forem necessárias.
No inciso LV do art. 5º da CF garantem aos litigantes/acusados o contraditório e a ampla defesa, com todos os meios e os recursos inerentes.
Entretanto, durante o processo administrativo fiscal, as normas são mais rígidas; a apresentação de documentação pelo contribuinte é limitada até o momento da impugnação, com exceção:
· impossibilidade de fazê-lo por motivo de força maior;
· referibilidade a fato ou direito supervenientes, ou, ainda;
· necessidade de contrapor fatos ou razões que foram posteriormente trazidas a discussão – § 4º do art. 16 do Decreto nº 70.235/1972:
Art. 16. A impugnação mencionará:
§ 4º A prova documental será apresentada na impugnação, precluindo o direito de o impugnante fazê-lo em outro momento processual, a menos que: (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 1997)(Produção de efeito)
a) fique demonstrada a impossibilidade de sua apresentação oportuna, por motivo de força maior; (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 1997)(Produção de efeito)
b) refira-se a fato ou a direito superveniente; (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 1997)(Produção de efeito)
c) destine-se a contrapor fatos ou razões posteriormente trazidas aos autos. (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 1997)(Produção de efeito)
Esta rigidez normatizada em um processo administrativo é um contrassenso, deveria ser, por princípio, mais flexível do que o judicial.
É desta forma que a doutrina enxerga e interpreta:
Segundo Hely Lopes Meirelles: “o princípio da verdade material, também denominado de liberdade na prova, autoriza a administração a valer-se de qualquer prova que a autoridade julgadora ou processante tenha conhecimento, desde que a faça trasladar para o processo. É a busca da verdade material em contraste com a verdade formal. Enquanto nos processos judiciais o Juiz deve cingir-se às provas indicadas no devido tempo pelas partes, no processo administrativo a autoridade processante ou julgadora pode, até o julgamento final, conhecer de novas provas, ainda que produzidas em outro processo ou decorrentes de fatos supervenientes que comprovem as alegações em tela.
Voltando a Lei 9784/99:
“Art. 60: o recurso interpõe-se por meio de requerimento no qual o recorrente deverá expor os fundamentos do pedido de reexame, podendo juntar os documentos que julgar convenientes”
Como pensa o CARF?
Os posicionamentos dividem-se:
· a não aceitação da prova após a apresentação da impugnação;
· sua aceitação apenas se apresentada até o julgamento de primeira instância, desde que complementares, e, residualmente;
· a aceitação em qualquer tempo, inclusive em última instância administrativa.
Qual é o objetivo do processo administrativo fiscal?
· confirmar a (i) legalidade do lançamento tributário, ao verificar se todos os requisitos formais e materiais foram atendidos, se os fatos a ela trazidos reproduzem o que efetivamente aconteceu.
Deste modo, pergunta-se: Por que não aplicar a forma mais flexível para que se otimize o processo administrativo tributário? Por que burocratizar tanto?
As garantias fundamentais do devido processo legal deve prevalecer, a apresentação das provas não deve ficar limitada a um tempo estanque, afinal vive-se em um estado democrático de direito, sendo que a culpa só se viabiliza com a condenação final e não antes.
Ao julgador cabe de forma fundamentada valorar todos os fatos e circunstâncias presentes no processo e construir um embasamento jurídico sobre a sua decisão para que se chegue a uma melhor decisão sem perder de vista a segurança jurídica e justiça fiscal.
Conforme pesquisa publicada sobre o Diagnóstico do Contencioso Tributário Brasileiro 2022 (Insper/CNJ) identificou-se que a solução de litígios na área tributária pode ser aprimorada, vejamos:
A resposta a pergunta...
Qual o percentual de decisões judiciais que confirmam ou que modificam a decisão do contencioso administrativo?
...foi emblemática:
51,4% das decisões proferidas em processos de primeira instância confirmam a decisão administrativa, enquanto 48,6% modificam o resultado definido administrativamente
Evidente que o percentual de 48,6 % é elevadíssimo!
Qual foi a causa deste elevado percentual?
A limitação normativa na seara administrativa (CARF) que impede aos julgadores utilizarem todo o universo probatório e investigativo para formação do seu convencimento fundamentado. Enquanto existir esta trava esse percentual continuará alto, ou seja, o que era para ser fluído tornou-se pesado para o sistema processual tanto na seara administrativa quanto na judicial.
Um trem não deve ser puxado por locomotivas que seguem em sentido contrário.
Quando a busca pela verdade segue orientações contraditórias está-se mais próximo da injustiça.
Fonte:
https://aslcorrea20201439.jusbrasil.com.br/artigos/1595836140/em-busca-da-verdade
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