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quinta-feira, 19 de maio de 2022

O enriquecimento ilícito e o pagamento indevido

I - O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO

No Código Civil, como cláusula geral, formula-se o enriquecimento ilícito:

Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.

Para Limongi França (Enriquecimento sem Causa. Enciclopédia Saraiva de Direito. São Paulo: Saraiva, 1987):

"Enriquecimento sem causa, enriquecimento ilícito ou locupletamento ilícito é o acréscimo de bens que se verifica no patrimônio de um sujeito, em detrimento de outrem, sem que para isso tenha um fundamento jurídico".

Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado, tomo XXVI, Bookseller, pág. 151) fala em enriquecimento injustificado.

O fundamento das relações jurídicas pessoais por enriquecimento injustificado está em exigência de justiça cumulativa, que impõe a restituição daquilo que se recebeu de outrem, sem origem jurídica. Também esse é o fundamento da obrigação de indenizar gastos que se fizeram, voluntariamente, no interesse de outrem.

O BGB (artigos 812 a 822) e o Código Suíço das Obrigações (artigos 62 a 67) generalizaram uma teoria ampla sobre a matéria, sob a invocação do enriquecimento indevido a todas as hipóteses a que falte ou venha a faltar a causa eficiente da aquisição, instituindo como consequência o dever de restituir. O Código Civil italiano de 1942 adere a esse posicionamento, com a criação de uma “ação geral de enriquecimento” (artigos 2.041 e 2.042), considerada como subsidiária, no sentido de que é cabível somente quando o prejudicado não em outra de ressarcimento direto e não exista norma excludente expressa.

De outro lado estão o Código Civil francês e o Código Civil italiano de 1865 (hoje revogado), o espanhol e outros que partem das ideias de Justiniano, segundo a qual o pagamento indevidamente recebido gera uma obrigação de restituir, correlata ou semelhante ao débito que se origina de um contrato.

Há ainda uma terceira corrente, vista no Código Civil da Áustria (artigos 1.431 e 1.437) e o Código Civil português (artigo 758), onde não aparece a teoria do enriquecimento sem causa desenvolvida e compreendida como tal, mas assegura-se ao que pagou por erro a faculdade de repetir o pagamento.

Por sua vez, o Esboço de Teixeira de Freitas (artigo 1.029) via na dívida a causa do pagamento, assentando que ele a pressupõe. E conclui que é repetível por erro essencial o que se paga quando se não deve. Mas o projeto não disciplinou o enriquecimento sem causa como instituto autônomo e envolvente dos vários aspectos sob que o considera a doutrina germânica, nem sistematizou a teoria romana das condictiones.

No desenvolvimento da matéria há de se supor que devem ser ressaltados os seguintes requisitos: a) a diminuição patrimonial do lesado, seja com o deslocamento para o patrimônio alheio, de coisa já incorporada ao seu, seja com a obstação a que nele tenha entrada o objeto cuja aquisição era seguramente prevista; b) o enriquecimento do beneficiado sem a existência de causa jurídica para a aquisição ou retenção; c) a relação de imediatidade, isto é, o enriquecimento de um provir diretamente do empobrecimento do outro, de tal maneira que aquele que cumpre a prestação de autoempobrecimento possa dirigir-se contra o que enriqueceu em virtude de uma causa jurídica suposta não existente ou desaparecida, ou, para dizê-lo, como acentuou Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de Direito Civil, volume II, 1976, pág. 254): o enriquecimento de um dos sujeitos e o empobrecimento do outro hão de decorrer de uma e mesma circunstância, como advertia Larenz (citado por Caio Mário, obra citada, pág. 254). Também no direito italiano, a teoria do enriquecimento sem causa, a doutrina assinalou a presença dos requisitos da respectiva ação: a) o enriquecimento de uma pessoa mediante um dano emergente ou um lucro cessante; b) o prejuízo de uma outra pessoa; c) um nexo de causalidade entre o enriquecimento de um e o prejuízo de outro; d) a ausência de íntima justificação para o fenômeno, como salientou Barassi (Obbigazioni, II, ns. 194 e 195).

Código Civil de 2002 demonstrou uma maior preocupação em evidenciar ou destacar o instituto do enriquecimento sem causa e de uma maneira geral, para uma maior abrangência, o que fez muito bem, no sentido de que tal instituto, conforme já exposto, passou a ser caracterizado como uma clausula geral do novo código, não podendo ser meramente limitada apenas ao conteúdo expresso na ei, muito pelo contrário, sua aplicação agora se dá por meio da interpretação do caso concreto, observando-se sempre a unidade do ordenamento, a luz da Constituição da Republica como referência maior a todos os demais diplomas.

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https://rogeriotadeuromano.jusbrasil.com.br/artigos/1504933562/o-enriquecimento-ilicito-e-o-pagamento-indevido

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