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quinta-feira, 28 de abril de 2022

A manutenção das desigualdades de gênero no sistema prisional

Antes de tudo é preciso salientar que, prisão é uma instituição projetada para homens, sua infraestrutura não foi pensada para suprir as particularidades do gênero feminino. Todavia, é obrigação do Estado garantir as necessidades básicas para que qualquer ser humano viva dignamente.

De fato, o Brasil é um país desigual. Da mesma maneira, o sistema carcerário é desproporcional em relação ao seu atendimento a homens e mulheres. Deve-se levar em consideração que a universalização desse sistema, inicialmente criado por homens e para homens, é algo perigoso e que só tem a prejudicar as minorias, com destaque ao grupo feminino. As mulheres apresentam demandas e necessidades diferenciadas àquelas manifestadas pelo grupo masculino e, por isso, o reconhecimento da importância da análise do encarceramento feminino enquanto uma categoria única e particular é um passo fundamental para a sua compreensão (ISAAC E CAMPOS, 2019, s.p.).

De forma a ilustrar as dificuldades enfrentadas pelas mulheres na instituição carcerária brasileira, é interessante transcrever alguns trechos de uma entrevista feita pela jornalista Nana Queiroz (2013) para o seu Blog “Presas que Menstruam”, em que narra as situações degradantes a que as mulheres são submetidas na prisão. Queiroz (2013, s.p.) afirma que “o poder público parece ignorar que está lidando com mulheres e oferece um ‘pacote padrão’ bastante similar ao masculino”, ignorando-se questões como “a menstruação, a maternidade, os cuidados específicos de saúde, entre outras especificidades femininas”.

Sobre a falta de roupas de cama, de vestuário e demais itens básicos de higiene, Queiroz descreve:

Esse é dos problemas mais patentes. Recebi diversos relatos, tanto em penitenciárias quanto em delegacias, de que não são distribuídos os itens e higiene suficientes. Isso é ainda mais grave para mulheres abandonadas pela família (um grande percentual das detentas). Nestes casos, elas procuram substituir os absorventes por papel higiênico, jornal ou até mesmo miolo de pão enrolado, que serve como um O.B. improvisado. Logo, itens de higiene se tornam moeda de troca dentro dos presídios, tão valiosos quanto cigarros, serviços de manicure e cabelereiro, entre outros (QUEIROZ, 2013, s.p.).

Além de ocorrer casos de violência sexual por parte dos agentes penitenciários, a visita íntima chega a ser mais uma das questões enfrentadas pelas mulheres do cárcere. Esse benefício é um direito garantido a todos os detentos, porém, as mulheres sofrem com a dificuldade de obter tal concessão, fato este que pode ser considerado discriminação institucionalizada de gênero. Muitos presídios femininos não tem sequer um local adequado para visitas, sejam elas sociais ou íntimas. Nana Queiroz (2013) expõe sua opinião em relação a isso:

Em minha opinião, e de diversos outros ativistas da área, isso é reflexo do machismo da sociedade brasileira. No sistema carcerário masculino, reina a visão de que o sexo "aplaca a violência do homem" e que nenhum homem é capaz de viver sem essa "necessidade básica". No sistema feminino, ao contrário, a relação da mulher com o sexo é tabu. Mais: mulheres que sentem essa necessidade são, silenciosamente, consideradas menos dignas. Há também o problema prático da gravidez. Os diretores de penitenciárias não querem arcar com os gastos extras representados por uma gestação. Ouvi, inclusive, que um delegado sugeriu que só permitiria visitas íntimas às detentas que tomassem injeções anticoncepcionais. Ora, obviamente não é sábio engravidar na prisão. Porém, essa não é uma decisão que caiba ao poder público e sim à mulher, que é dona de seu corpo mesmo enquanto cumpre pena. As poucas penitenciárias que permitem os encontros íntimos das detentas com seus cônjuges (e é importante dizer que o Estado só entende como cônjuge um homem, logo lésbicas perdem esse direito completamente) enfrentam ainda o problema do abandono. As dificuldades impostas ao relacionamento são tantas que, quando as portas são abertas, são poucos os homens que resistiram e permaneceram fiéis à suas parceiras encarceradas (QUEIROZ, 2013, s.p.).

A falta de assistência médica voltada para a saúde feminina também é uma realidade dos estabelecimentos prisionais, como relata Queiroz (2013) ao expor que as detentas não têm acesso a exames preventivos de rotina, como, por exemplo, o Papanicolau. Falta, até mesmo acesso aos cuidados médicos relacionados a DSTs e para casos de dependência química:

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https://thaticanedo10.jusbrasil.com.br/artigos/1478979362/a-manutencao-das-desigualdades-de-genero-no-sistema-prisional

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