Um dos brocardos mais famosos do Direito Penal é o In Dubio Pro Reo. Seu sentido é bem fácil de entender: na dúvida, decida em favor do réu. Em outras palavras, se houver dúvida quanto à condenação de um indivíduo, ele deverá ser absolvido.
Essa absolvição decorre de um postulado lógico: o que é menos pior?
Absolver um culpado ou CONDENAR um inocente?
É evidente que a condenação de um inocente é o pior cenário que podemos conceber no decorrer de um processo penal. Não há ofensa maior à integridade física, psíquica e moral de um ser humano do que condená-lo por algo que não cometeu, principalmente se essa condenação for advinda de um processo criminal.
Um simples inquérito policial (eu sei que para o investigado não é tão simples assim) instaurado contra um inocente, por si só, provoca grandes abalos psicológicos em uma pessoa. Ademais, causa uma estigmatização que nem mesmo o seu arquivamento ou ulterior sentença absolutória serão capazes de apagar.
Diante disso, o próprio Código de Processo Penal fez questão de positivar, no inciso VII do artigo 386, a imposição da absolvição no caso de dúvida:
Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:
VII – não existir prova suficiente para a condenação.
É a consagração, no diploma legal, do In Dubio Pro Reo. Ou seja, se há alguma dúvida, por menor que seja, o réu deve ser absolvido.
Pela leitura do preceito legal supracitado, percebemos que a condenação só pode existir em um cenário que haja, com o perdão da redundância, uma certeza plena, manifesta e absoluta da responsabilidade penal do agente que está sentado no banco dos réus.
Sendo assim, se houver o menor resquício de que aquela pessoa pode ser inocente, retornamos à problemática apresentada no início do texto: é menos pior manter um culpado solto do que um inocente preso.
Mas isso é a teoria. A prática é outra.
Na prática, assistimos que a lógica a ser seguida é a do In Dubio Pau no Réu!
O que se vê na vida real é que se houver dúvida entre a condenação ou absolvição, é que a primeira deve ser seguida!
Mas e se o réu for inocente?
Bom, aí é problema dele! Que apele para a segunda instância!
Estabeleceu-se, portanto, uma lógica dantesca, que deturpou a garantia inerente aos réus no processo penal, impondo, de forma implícita (nem tanto) e observada na atuação prática, que só se deve absolver uma pessoa quando houver um juízo de certeza, já que na dúvida, é melhor optar pela condenação.
Qual é a consequência disso?
Além de uma afronta direta contra um direito fundamental pertencente a qualquer ser humano que for processado por algum delito, há também uma perigosa inversão dos papéis e das regas no jogo do processo penal.
Com o "In Dubio Pau no Réu", a acusação passa a não ter mais a obrigatoriedade de provar, de modo inequívoco, a materialidade e autoria do réu no suposto crime, já que neste panorama, a defesa que fica incumbida do ônus de provar que o réu não é o culpado.
Em desfecho, percebemos na prática, de forma axiomática, que a o raciocínio que impera é: havendo dúvidas sobre a culpa do indivíduo, condene-o; em contrapartida, somente absolva-o se possuir plena certeza de sua inocência.
Tenho esperanças que a figura do Juiz das Garantias poderá alterar esse cenário - ou ao menos reduzir a incidência desse completo disparate que, infelizmente, se tornou banal.
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